Esta série que está saindo pela Editora Devir traz aos leitores a oportunidade de conhecer histórias de Espada e Feitiçaria (ou como o Roberto Causo advoga, Borduna e Feitiçaria) ambientadas no Brasil contendo elementos de nossa cultura, ou folclore, ao invés de buscar inspiração (tipicamente) no folclore europeu.

O livro trás duas noveletas, “O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara”, de Christopher Kastensmidt, e “A Travessia”, de Roberto de Sousa Causo. A primeira é a primeira parte da sequência “A Bandeira do Elefante e da Arara” e a segunda é a continuação da “Saga de Tajarê”, que já vimos aqui quando falamos do livro “A Sombra dos Homens”.

O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara

Somos apresentados à dupla Gerard Van Oost, um holandês que veio se aventurar no Brasil, e Oludara, um escravo recém chegado ao Brasil. O fortuito encontro destes dois personagens se dá na cidade de Salvador na época das bandeiras, no Brasil Colônia.

Gerad está com dificuldades para realizar seu desejo de explorar o interior do Brasil, pois por ser de religião protestante e outras circunstâncias peculiares, não conseguiu ingressar em nenhuma Bandeira. Mas uma oportunidade surge e este tem apenas alguns dias para solucionar a questão, isto é claro, irá envolver Oludara. Como representantes de um Brasil fantástico, já na primeira narrativa, marcam presença o Boitatá e o Saci-Pererê e é certo que muitas outros seres e lendas venham a aparecer nas narrativas seguintes.

O autor nos apresenta um texto bastante fluido e que evoca imagens vívidas. Os personagens são bem construídos, interessantes e tanto Gerard como Oludara são bastante cativantes.

A Travessia

Esta noveleta é uma continuação da saga que teve inicio em A Sombra dos Homens – A Saga de Tajarê (já falamos deste livro aqui). Tajarê e sua esposa, a sacerdotisa viking Sjala, precisam voltar para casa e para tal, devem atravessar o Grande Rio. A jornada está repleta de encontros com criaturas fantásticas e conflitos subsequentes. Foi bom rever o índio Tajarê empunhando sua Borduna Relâmpago, o nome que deu a uma espada que obteve do confronto anterior com os vikings que viajaram às Américas acompanhando Sjala.

É de fato um tipo de universo único, o criado pelo autor, e na busca de levar o leitor àquele mundo ainda sem a presença dos colonizadores europeus, o autor usa a linguagem para fazer a narrativa soar de algum modo indígena e/ou refletir a mentalidade e visão de mundo de culturas diferentes. Penso que isto caberia bem se restrito à fala dos personagens, no entanto o uso especial da linguagem se estende a algumas partes da narrativa deixando a leitura do texto pouco fluente. Nada com o que o leitor não possa se habituar.

E mais…

Além das duas noveletas, temos um excelente prefácio por Roberto de Sousa Causo que nos faz refletir sobre a literatura que consumimos e como nos esquecemos facilmente de alguns precursores que escreveram textos fantásticos considerando nossa herança cultural.

Pode se pensar que estejamos todos doutrinados a ver a história, ler e ver filmes e livros, (ao menos no gênero fantástico) com forte presença do folclore estrangeiro. Isto é até natural, visto que nossa cultura tem como, possivelmente, o mais influente componente a herança portuguesa. Mas a brasilidade, nossa identidade cultural, vai além disso e certamente devemos isso à contribuição dos povos indígenas, povos de diferentes nações africanas, imigrantes italianos, alemães, japoneses, libaneses (entre outros) e no final de tudo isso, devemos à nossa bendita miscigenação. Neste livro os autores exploram um resgate dessa identidade e nos estimulam a descobrir e explorar um sabor único do gênero fantástico. Fica a deixa para que mais autores explorarem estes caminhos.

Aguarde mais notícias sobre a série, pois já estamos com o segundo livro aqui que trás mais duas noveletas destes mesmos autores. Antes que me esqueça, vale mencionar que temos belas ilustrações internas no livro.

Viste os sites dos autores:

Christopher Kastensmidt – http://www.eamb.org

Roberto de Sousa Causo – http://robertocauso.com.br/

Bônus

Ilustrações de Gerard van Oost e Oludara feitas por Carolina Mylius – http://carolmylius.com/

 

3 / 5 stars