Ah, procurando por magia e sistemas de magia? Chegou agora? Leia a parte 1 antes…

Percebi que o assunto de sistemas de magia está sendo bastante procurado, então resolvi expandir o artigo anterior com mais partes. No primeiro artigo, focamos em perguntas gerais, mas não trouxemos tantos exemplos. Nas novas partes traremos um lado mais prático. Para fazer isso, vou falar sobre os sistemas de magia usados nos meus universos ficcionais. Neste artigo:

Terra das Nove Luas

Essa é a ambientação que mais desenvolvi em termos de romances e contos. Sete romances e uma dúzia de contos. Saiba mais aqui. Esse universo ficcional nasceu de um jogo de RPG de mesa e o sistema que eu utilizava era o GURPS. A magia está presente o tempo todo nos livros e naturalmente, herdou alguns conceitos do sistema de magia GURPS MAGIA. Como foi meu primeiro universo ficcional é também o mais “tradicional”, aqui temos elfos (silfos), anões, orcs (bestiais), dragões, povos feéricos, magos e clérigos, etc.

Poderes e sua fonte

Em termos de poderes sobrenaturais há basicamente dois tipos trabalhados nos livros: a magia e os poderes psíquicos. Ambos se baseiam numa matriz energética subjacente à constituição de todas as coisas. O mana, como fonte da magia e jii, como fonte dos poderes psíquicos.

No GURPS, a magia custa pontos de energia que podem ser retirados de três fontes principais: a força interna do utilizador (fadiga), a saúde física e de gemas ou objetos que armazenam magia. Essas três fontes são renováveis, mas em ritmos distintos. 

A fadiga, vem da força do personagem e um mago pode fazer relativamente poucas magias usando essa fonte até que fique cansado demais para ficar de pé, ou até mesmo desmaie, perdendo os sentidos. No entanto, ele pode fazer magias, ficar cansado, descansar, por cerca de 30 minutos e estar apto a fazer mais magias novamente.

A força vital pode ser usada, mas conforme o mago utiliza essa fonte, o uso da magia causa ferimentos ao seu organismo, podendo levar à sua morte. Tais ferimentos podem levar dias, ou mesmo semanas para curar. Então, esse uso, além de perigoso, não é muito sustentável.

A magia acumulada em gemas, se reunida em abundância, pode fazer um mago desbalancear as coisas, até mesmo mudar o rumo de uma batalha entre exércitos. Porém, sua taxa de recuperação é normalmente lenta, levando dias ou semanas para uma gema voltar a absorver magia do ambiente.

Uma quarta fonte são os (raros) ambientes ricos em magia, locais especiais como templos, cavernas/florestas místicas e santuários. Nesses lugares a magia pode ser feita mais livremente e com maior potência, porém com eventuais consequências trágicas. Uma falha numa convocação em tais locais, provoca resultados desastrosos.

Todos esses elementos geram uma lógica que pode ser usada de modo narrativo. Por exemplo, um mago, num momento crucial, pode gastar toda energia de reserva das gemas, depois, sua fadiga e por último, até mesmo sacrificar sua vida para realizar algum feito importante na história. Tudo isso vem de uma limitação da magia.

Se pensarmos na lógica da energia por trás da magia, podemos gerar diversas consequências a serem exploradas no mundo ficcional. Por exemplo, armazenar magia em gemas pode se tornar uma atividade econômica. Magos, ou mesmo não magos, podem levar gemas vazias a lugares para a recarga e cobrar por isso. Magos podem viver de ceder sua fadiga, várias vezes por dia, para gerar carga e vender a energia armazenada. Também podem ser usados seres vivos como fonte, causando desequilíbrio e sofrimento. Um estado/governo que se organize em torno disso, pode acumular energia em larga escala armazenando-a em fortalezas e usando-a para defesa ou ataque. (como acumulava-se pólvora em paióis para alimentar esforços de guerra).

Isso tudo que falamos está relacionado à questão do artigo anterior: Custo ou preço da magia.

Nos livros da Terra das Nove Luas, como Olhos Negros, muitos personagens usam magia. Uma das protagonistas, Kiorina DeLars é uma estudante de magia e lida com essas limitações de custo para ajudar seus companheiros de jornada. Já os principais antagonistas, os necromantes, drenam magia dos seres vivos para aumentar seu poder e fazer convocações sombrias. O que nos leva ao assunto das escolas e tipos de magia.

Tipos de magia

No GURPS MAGIA, a magia está dividida em várias escolas, são elas: magia de alimentos, cura, necromânticas, proteção e advertência, animais, plantas, elementais, controle da mente, controle do corpo, som, luz e trevas, reconhecimento, comunicação e empatia, quebrar e consertar, ilusão e criação, meta-mágicas e encantamentos. Observe que é inviável transcrever um livro inteiro sobre magia com mais de 100 páginas para um artigo. Mas ainda assim, vejamos um pouco mais sobre escolas de magia.

O livro traz tantas magias, que é praticamente impossível que um personagem domine todas elas. Numa história, também é difícil ter espaço para mostrar tantas magias em harmonia com a trama.

Também não é possível que todas as magias sejam ensinadas numa mesma instituição, ou que sejam dominadas por um mesmo povo. Por exemplo, talvez seja interessante que quem guarda os segredos de magias com plantas e animais sejam os elfos, que as magias de cura, sejam objeto de estudo dos clérigos, que magias de combate sejam ensinadas em escolas bélicas, enquanto controle do corpo e empatia, em monastérios. Já as magias necromânticas podem ser proibidas, conhecidas no submundo por elfos sombrios, ou esteja em grimórios raros de uma civilização antiga que ruiu devido ao uso exagerado de magia, criando assim o estigma sob alguns tipos de magia.

Na Terra das Nove Luas, muitas magias foram banidas. Magias que demônios ensinaram a humanos ambiciosos. A promessa de grande poder seduziu esses magos e depois, abriu caminho para que os demônios ganhassem força e dominassem o mundo.

No caso dos elfos, eles organizam o ensino de magia em torno de seus templos, cada culto às divindades da natureza está ligado a determinados tipos de magia.

Outro elemento trabalhado nesse universo, relacionado à disponibilidade de magia, foi a magia lunar. Uma das principais fontes de magia neste universo é uma das luas que orbitam o planeta. De constituição cristalina essa lua emana energia mágica. O povo antigo criou torres com centenas de gemas de magia que funcionam como imensos captadores da energia mágica lunar. Com tanta energia, um governo de magos (arquimagos) surgiu, e com ele, uma sociedade quase utópica, com suas imensas cidades, torres e elevadores se desenvolveu.

Os poderes psíquicos nesse mundo, vem do jii. O jii e o mana, se originam de uma mesma energia primal, mas se configuram e se comportam de modo diferente. Então, todas as magias “mentais” são direcionadas àqueles que estudam o caminho do jii. O anti herói, Calisto, apresentado no romance Maré Vermelha, mostra o quão terríveis poderes telepáticos podem ser nas mãos de uma pessoa com moralidade cinzenta.

Objetos mágicos

A magia também pode ser trabalhada para construir objetos. Espadas mágicas e diversos itens de grande poder foram desenvolvidos pela aliança entre humanos, elfos e anões durante a Era Maldita, mostrada no romance Quill, o exterminador de demônios (e na HQ). No caso destes itens, além da magia, espíritos de magos eram aprisionados nas armas para conferir inteligência e maior poder para os usuários.

Alguns arquimagos sacrificaram suas vidas para colocar seus espíritos em medalhões de grande poder mágico. Esses itens aparecem nos romances Herdeiros de Kamanesh e O Coração de Tleos. Não estou citando livros por citar, mas para demonstrar que de uma mesma base de princípios podem ser derivados vários sistemas de magia e aplicados em diferentes obras, permitindo explorar a presença da magia nas histórias, trazendo mais elementos para as tramas. No entanto, é interessante não colocar tudo de uma vez em apenas um livro. Isso sobrecarregará os leitores.

A série Stormlight, de Brandon Sanderson, explora vários tipos de magia, mas esse conteúdo é mostrado aos poucos ao longo dos livros da série.

Lei de Sanderson

Lembrando a primeira lei de Sanderson, é importante gerar compreensão sobre o funcionamento da magia para ela funcionar de modo satisfatório na história sem parecer “trapaça”.

Então, quanto mais você, como escritor, compreender as regras do sistema de magia que estiver criando para suas histórias, melhor. No caso dos romances da Terra das Nove Luas, eu utilizei um atalho, pois o GURPS MAGIA é um manual completíssimo, cuja lógica e regras, eu já conhecia bem para poder aplicar nos meus jogos de RPG. Eu tinha uma boa base de onde selecionar elementos e aplicar no meu universo ficcional, mas nunca me deixei ficar preso demais a essas regras originais. Usei-as mais como inspiração que como manual.

Espero que esse artigo ajude na construção de seus sistemas de magia e universos ficcionais!

Nas próximas partes, vou abordar os sistemas de magia do universo das Crônicas Delorianas e do Velho e Devoradora de Almas.